Caminhamos a pé, fora das estradas pavimentadas e engarrafadas dos célebres filósofos. Preferimos a filosofia das ruas e a meditação. Queremos conhecer-nos,procuramos a lei fundamental de nossa essência e a que está muito acima de nós mesmos. Não ficamos estudando só teorias como nos ensinaram nas Faculdades.
"Sophos" é a palavra clássica usada na Filosofia para designar o sábio. Para nós só será sábio, se nos remeter ao sabor, que inclui beleza, bom-gosto, sutilezas. Sabemos escolher e criar, isto nos coloca no caminho da felicidade.
Vejamos Epicuro que abria sua escola às mulheres e aos escravos e lecionava ao ar livre, no jardim e não na academia, classificava os platônicos, atletas de ponta da teoria, como papagaios, tiranos, bajuladores e atores da filosofia.
Estes são os que usam as teorias para se mostrarem, mas não provam nem indicam como é possível viver de acordo com elas. Os poetas da vida (verdadeiros filósofos), ao contrário, antes de mais nada, atletas amadores da filosofia, praticam o logos no cotidiano. Cozinham em fogo lento e preparam teorias vitaminadas, justamente quelas que servem para a vida.
Os exemplos devem ser dados na vida tangível e não meramente nos livros.
No tangível, vamos comentar um pouco sobre a felicidade , que é o tema de nossa postagem, ao mesmo tempo proporcionando algumas dicas para alcançá-la.
Etimologicamente, a palavra felicidade quer dizer "estado de plenitude", por vezes equiparado ao "estado de prazer". Naturalmente, o prazer é um sentimento agradável mas é relativo e fugaz. A felicidade , por sua vez, é o estado de consciência de quem participa da vida divina, da forma em que ela se exprime nele e em sua volta.Ora, quando atingido, esse estado de consciência é absoluto e durável. Desconfiemos, portanto, da busca de prazer enquanto tal, pois ela pode nos arrastar para o turbilhão permanente da insaciabilidade e da insatisfação. Na realidade, o prazer em si não é a felicidade, mas a ilusão da felicidade. Khalil Gibran escreveu a este respeito:
Sim, em verdade, o prazer é um canto de liberdade.
E de bom grado eu vos veria cantá-lo de todo coração;
mas não gostaria de vos ver perder vosso coração nesse
canto.
E, como bem observou Sócrates, a identificação do prazer com a felicidade reduz-se à mera fruição e leva a uma vida superficial, para não dizer artificial. Sendo o prazer a condição de fruição, o homem torna-se, necessariamente, escravo do prazer quando procura a felicidade através dele. Não está aí o exato oposto da felicidade? Posto que a felicidade é um estado de plenitude, está implícito o viver em harmonia com uma ordem estabelecida, isto é, em conformidade com as leis que regem o homem em particular e o universo em geral . Entretanto este estado só pode ser apreendido por intermédio de nosso eu interior. Isso significa que a felicidade mora em nosso coração, é a emoção de nossa alma. Contagiosa, ela balsama e influencia todos que cruzam nosso caminho.
Todos os sábios do passado afirmaram que as virtudes são próprias de nossa alma, são a chave de nossa felicidade. Um dia, um amigo me brindou com as seguintes palavras: A ti confio: Podes imaginar algo mais belo que a tua alma? Ela é a própria essência Daquele que a deu para ti. Não busques senti-la perfeitamente, mas comunga-te com ela. Busca a alma por suas faculdades, porém conhece-as por suas virtudes.
O que caracteriza uma virtude é o fato de ser sinônimo de liberdade, quando praticada. Com efeito, quanto mais virtudes exprimimos em nossos pensamentos e comportamentos, mais nos emancipamos e mais livres nos sentimos. Foi por isso que Epicteto (50-138 d.C.), o escravo filósofo grego, estóico e que viveu a maior parte de sua vida em Roma, disse: "Achas que serás feliz quando tiveres obtido tudo o que desejas. Enganas-te. Quando possuíres tudo o que desejaste, terás as mesmas inquietudes , as mesma tristezas, os mesmos desgostos e os mesmos medos. A felicidade não consiste em adquirir e usufruir, mas em não desejar. Pois consiste em ser livre. Na mesma linha de raciocínio, a filosofia budista ensina que sofremos porque desejamos. Em virtude deste princípio, Buda (563a.C. - 483a.C.) e seus seguidores preconizam aos homens que se desapeguem de todo desejo, condição absoluta para se elevarem espiritualmente e alcançarem a felicidade da alma.
Essa concepção lembra os versos de Victor Hugo, o poeta-filósofo:
"Seja como o pássaro pousado um instante
Em cima de ramos muito delicados,
Que sente vergar o galho e, mesmo assim, canta,
sabendo que possui asas."
Idealmente, a felicidade situa-se na aptidão em amar todos os seres e respeitar tudo que vive. Inspirados por tal amor, sentimos um único desejo, aquele que é positivo e útil, ou seja, o de usar nossos dons e talentos para ajudar a nós mesmos e ao próximo, para proporcionar a paz ao mundo. Isso para nós será muito simples, pois será cultivar a serenidade e seguir a voz de nosso coração. Assim, permitiremos que nossa alma expresse plenamente a sabedoria que ela possui e descobriremos que é no mais profundo de nosso ser que se encontra a fonte da felicidade.
Mais algumas dicas para ser feliz:
- Todo homem é capaz de fazer o bem a outro homem, mas é importante que ele contribua para a felicidade de uma sociedade inteira.
- Há na Terra tamanhas imensidões de miséria, de angústia, de inquietude e de horror, que o homem feliz não pode pensar nisto, sem sentir vergonha de sua felicidade . E, no entanto, nada pode fazer pela felicidade de outrem aquele que não sabe ser feliz.
André Gide (1869-1951)
- Toda felicidade é uma obra-prima: o menor erro a deforma, a menor hesitação a altera, a menor inépcia a enfeia, a menor tolice a imbeciliza.
Marguerite Yourcenar (1903-1987)
- Pratique o saber com sabor e você será feliz!
LEIA:
Dez leis para ser feliz - Augusto Cury. Rio de Janeiro, 2003. O autor nasceu em São Paulo em 1958.
Ensaios de Moral e Política - Francis Bacon, 1626. O autor nasceu em Londres em 1561 e morreu em 1626. Muito contribuiu para o progresso da ciência e da filosofia espiritualista.